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Alfredo Manevy - 93 - Fevereiro de 2003
Luz e sombra
Foto do(a) autor(a) Alfredo Manevy

Walter Lima Jr.
Viver Cinema
Carlos Alberto Mattos
Casa da Palavra (Tel. 0/xx/21/222-05252)
416 págs., R$ 40,00

"Viver Cinema" é o testemunho do mais "desafinado" realizador do cinema novo: como crítico, Walter Lima Jr. foi um observador do cinema internacional. Impulsionado pelo cinema novo, seguiu a pauta do movimento ("Menino de Engenho") para, mais tarde, afirmar um estilo autônomo. A busca dessa autonomia é o achado dramático da biografia, mas o critério no diagnóstico histórico parece ser -quase sempre- o posterior rompimento de Lima Jr. com Glauber Rocha. Carlos Alberto Mattos revela a ausência da dicotomia "arte ou indústria" em Lima Jr., o pioneirismo do diretor na abertura à tevê ("Globo Repórter", "sitcoms", telefilmes) e às encomendas variadas. "Viver Cinema" é um retrato da versatilidade (talvez o segredo da longevidade de Walter Lima Jr.). Numa cinematografia constituída de ciclos e carreiras abortadas, o livro é relato de ressacas e superações na busca de continuidade (pessoal e cinematográfica). Destaca-se o capítulo dedicado aos improvisos de "A Lira do Delírio", experimento radical iniciado em 1973 e só concluído em 1978.


Canibalismo dos Fracos
Alcides Freire Ramos
Edusc (Tel. 0/xx/14/235-7111)
362 págs., R$ 35,00

"Os Inconfidentes", de Joaquim Pedro, é um filme marco nas relações -hoje pouco produtivas- entre cinema e história nacional. Historiador com raro domínio da narração cinematográfica, Alcides Freire Ramos penetra no processo de roteirização e pesquisa do filme para revelar como Tomás A. Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa são parodiados como bajuladores intelectuais pequenos-burgueses. Sempre reconhecendo o brilho e a ambiguidade irônica desse filme moderno, o autor acumula evidências em torno de uma leitura "obreirista" da Inconfidência promovida por Joaquim Pedro e Eduardo Escorel. No roteiro, interpretações dos autos da devassa e outros partidos tomados criaram, para Ramos, "uma contraposição entre a dignidade dos ativistas e a pusilanimidade dos intelectuais". Além da excelente análise narrativa de "Os Inconfidentes", confirmando seu lugar de destaque no cinema moderno, o livro é uma sugestão de método para a aproximação entre estudos de cinema e história do país.


A Sombra da Outra
Afrânio Mendes Catani
Panorama (Tel. 0/xx/11/610-11165)
352 págs., R$ 25,00

A "Companhia Cinematográfica Maristela" (1950-1958) foi criada como alternativa ao estardalhaço e às pretensões da "Vera Cruz". O capital investido por uma família do ramo de tecidos inspirou-se, inicialmente, no sucesso do neo-realismo italiano. Que, mais tarde, a "Maristela" tenha filmado em estúdios e mantido atores sob regimes contratuais é apenas uma das ironias da história investigada por Afrânio Catani. Há notáveis anedotas: técnicos não falam a língua dos atores, distribuidores americanos fazem trambique, críticos querem propina, um projeto sobre Getúlio é minado por uma trapalhada política. Catani acompanha o naufrágio das contas da companhia e a resistência de Marinho. É certo que tais entraves iluminados pelo livro ainda persistem no cinema nacional. O fracasso da iniciativa privada sem intervenção do Estado teve, na pequena "Maristela", um exemplo vigoroso.


A Imagética da Comissão Rondon
Fernando de Tacca
Papirus (Tel. 0/xx/19/327-24500)
135 págs., R$ 28,00

No projeto de integração via telégrafo do interior do Brasil, a Comissão Rondon teve um braço de registro cinematográfico dirigido pelo major e fotógrafo Thomaz Reis. Entre outras informações valiosas, a pesquisa aponta como esse pioneiro criou um modo artesanal de revelação de negativo, capaz de acompanhar Rondon e resistir ao clima da selva. Dos filmes produzidos pela Comissão poucos sobreviveram, ao lado de fotogramas publicados nos livros da série "Índios do Brasil". Analisando a relação da câmera com os rituais indígenas mapeados por Rondon, o autor percebe como a imagem inicial de "selvagem" atendeu a uma procura de assombro e foi de encontro a um mito original de brasilidade. Em seguida, o autor aponta o surgimento de um índio "pacificado" e, finalmente, "integrado". Comparada à visão salesiana do índio vestido e obediente, presente em alguns documentários da época, o livro revela como a imagética de Rondon foi mais rica etnograficamente.


ALFREDO MANEVY é doutorando em cinema na Escola de Comunicação e Artes (USP).

Alfredo Manevy é doutor em cinema pela Escola de Comunicações e Artes da USP.
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