Shakespeare dizia que “há mais mistérios entre o céu e a terra do que a vã filosofia dos homens possa imaginar”, em se tratando do desconhecido aos olhos néscios deste mundo. Todavia, se o autor inglês fosse semioticista, certamente alteraria “céu” e “terra” pelos “planos de expressão” e de “conteúdo” que, muito além do que se lê, encontram-se nos mais variados códigos da comunicação, como a dança, as artes plásticas, o design e, sobretudo, a imagem por eles representada.

Pietroforte, sob a luz da Semiótica Tensiva desenvolvida por Claude Zilberberg e Jacques Fontanille, abraça a missão de tornar “a semiótica visual simples e sem mistérios” aos leitores (estudiosos das ciências da linguagem), haja vista a pertinência dos estudos semióticos em pesquisas atuais voltadas ao simbolismo audiovisual.

Elucidando terminologia e prática em pesquisa, Pietroforte organiza sua obra em sete capítulos e vinte e nove subcapítulos voltados a distintas construções de imagem por meio da concepção da: 1) música, 2) formas plásticas, 3) sinestesia, 4) história em quadrinhos, 5) questão erótica x pornográfica e 6) fotografia.

No primeiro capítulo, o autor debruça-se nas reflexões acerca da Semiótica Tensiva enquanto semiótica, sem preciosismos teórico-discursivos. Por meio de exemplos extraídos de clássicos da literatura brasileira, Pietroforte apresenta um exímio trabalho didático concernente à construção do quadrado semiótico como forma de esclarecer ao leitor a relação entre termos opostos, parte da rede capaz de gerar sentido. O autor faz, ainda, constante uso de funções exponenciais, lineares, crescentes e decrescentes, recursos que, apesar de parecerem “estranhos” aos amantes das ciências da linguagem, são cruciais à compreensão dos níveis de tensão discursiva que compõem a metodologia empregada nos estudos semióticos.

Nos capítulos 2, 3, 5 e 7, Pietroforte apresenta ao leitor distintos percursos gerativos de sentido a partir de planos de expressão e de conteúdo inseridos na música, nas formas plásticas, nas histórias em quadrinhos e na fotografia, e é nessa empreitada que o autor logra transcrever conceitos abstratos em tabelas, esquemas e gráficos que ilustram as etapas do estudo semiótico por meio do semissimbolismo e de categorias plásticas eidéticas extraídas e/ou concebidas a partir de textos visuais.

A sinestesia toma espaço no capítulo 4, sendo descrita por Pietroforte como “semiótica não verbal, ou seja, semiótica plástica, dos odores e gustativa”. Sob o ritmo da poesia de João Cabral de Melo Neto, o autor presenteia o leitor, mais uma vez, com sua didática multidisciplinar e multimodal, utilizando-se de exemplos concretos para a elucidação de conceitos abstratos da semiótica tensiva.

Afastando-se da polêmica gerada pelo senso comum a respeito do erótico x pornográfico, Pietroforte cuida da temática com seriedade e com embasamento, desta vez, na música de J. M. Cano. Analisando as dimensões estéticas da letra, o autor preconiza explicitar a forma pela qual a concepção do erotismo x erótico tem sido relativizada a partir de preceitos religiosos e/ou morais, o que pode ser confrontado pelo percurso gerativo de sentido resultante das tensões narrativas presentes em tais manifestações não verbais.

É fato que a Semiótica Tensiva apresenta um vasto uso de terminologia que pode ser desafiadora àqueles que pretendem iniciar sua aventura em busca da solução dos mistérios presentes no texto. Não obstante, Pietroforte cumpre com sua palavra ao tratar de conceitos e de metodologia de estudo do texto visual de forma didática, dinâmica e multidisciplinar.

LUCAS ALMEIDA é graduado em Letras e, atualmente, cursa pós-graduação em Estudos Linguísticos e Literários em Inglês na FFLCH - USP